terça-feira, 29 de março de 2011

O poeta triste

( Origem da imagem aqui )

O poeta sentou-se, exausto.

“Terminei a minha obra prima, mereço descansar…” - pensou, encostando-se ao troco da árvore.

E assim permaneceu, atento ao cair das folhas… na esperança vã que a brisa primaveril o bafejasse de novo com a inspiração.

Mas o tempo passou, passou… as brisas deram lugar ao estio e às tormentas do Outono… e a inspiração… não chegava.

“ Só uns versos, não peço mais… só o inicio de uma estrofe…”

Mas nada…. Rigorosamente nada lhe brotava dos dedos, nem a simples vontade de afagar a erva macia onde se sentara.

Foi então que um pequeno pássaro castanho – talvez um pardal – lhe pousou aos pés, estranhando tal imobilidade.

- Morreste, ó poeta? – chilreou ele, de um jeito pouco comum nos da sua espécie.

- Não, pardalito… não morri… estou simplesmente à espera que me chegue a inspiração…

O pardal abriu o bico, hesitando em responder.

Segundos depois, levantou de novo voo, desaparecendo entre as folhas secas das acácias.

O poeta permaneceu sentado, ainda à espera.

No dia seguinte, o pequeno pardal, no seu voo matinal em busca de sementes, encontrou-o no mesmo local, encostado ao tronco da árvore, contemplando ansioso o percurso das nuvens no céu.

- Bom dia poeta… - cumprimentou o pardal – já encontraste o que procuravas?

O poeta balançou a cabeça, o desânimo estampado no rosto.

- Ainda não… passam ventos, dias e noites, estações, chuva e até crianças a brincar… só não passa a minha inspiração…

O pequeno pássaro seguiu viagem. Havia que aproveitar o dia, o Inverno aproximava-se a passos largos e urgia recolher todo o alimento que fosse possível encontrar.

Passaram-se alguns dias, até os caminhos do pequeno pardal se cruzarem com a árvore descanso do poeta.

- Bom dia poeta… como estás hoje?

O poeta, visivelmente mais magro e abatido por tão prolongada espera, lá conseguiu erguer um dedo e esboçar um sorriso.

- Olá, pardalito… continuo à espera… continuo à espera…

Desta feita, o pardal não conseguiu mais conter a resposta.

- À espera? À espera de quê?

- Da inspiração, claro… que mais poderia ser? Eu sou um poeta, não percebes? Preciso de inspiração…é o meu alimento, sem ela eu morro…

O pardal chilreou algo ininteligível.

- Poeta… eu também morreria… se não procurasse todos os dias o meu alimento…

- Ora …. Isso é fácil… tu tens asas, podes voar, percorrer os campos… ah, se eu ao menos pudesse voar…

O pequeno pardal esticou as asas, preparando-se para levantar voo.

- Poeta, poeta… se eu ao menos pudesse falar, caminhar, ser humano… mas crês tu que sou menos feliz por não o ser?

E como o poeta não lhe soubesse responder:

- Poeta, poeta… que triste poesia é a tua… que nem no milagre de teres encontrado um pássaro que fala contigo consegues ver um pouco de inspiração…


10 comentários:

  1. Bah! Que linda lição esse pardal deu ao poeta...

    Ele havia esquecido que tem asas também, as da imaginação e com elas, pode voar looooooooooooooooooonge!!!

    ADOREI!!!

    abraços,tudo de bom,chica

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  2. Muito boa a história que pode ter diversas conclusões. A minha tirada na diagonal refere que afinal este poeta à espera da sua inspiração foi ficando egoisticamente insensível ao que se passava em redor.

    No fim, o pardal foi o verdadeiro poeta sábio :))

    Parabéns e grato pela partilha. Abraço ^_^

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  3. A inspiração vem sempre de onde menos se espera... um verdadeiro poeta, está atento ao que o rodeia... e mais se inspira quanto menos suspira por inspiração. :)Beijinho

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  4. até um simples pássaro quis mostrar ao poeta o valor que ele tem..

    bjs.Sol

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  5. Uma óptima lição de vida... e tão bem contada!

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  6. Oi Rolando
    O poeta está cansado e esqueceu suas fontes de inspiração - sua própria tristeza já lhe daria bons versos rsrs
    falta-lhe uma musa que lhe desperte desse cansaço rs

    Oi poeta Rolando e voce como vai?
    seu conto poético com falas de um pardal é uma inspiração que emociona e naõ precisa ficar a espera ... tá pronto! rs

    abraços amigo
    desculpe nao vir mais vezes aqui, ando que nem esse poetinha sem inspiração pra escrita - lendo só lendo .

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  7. Rolando,

    A inspiração também pode ser contemplativa.
    Por vezes, há mais poesia no silêncio que nas palavras... Bjs

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  8. Eu só converso com Cegonhas...

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  9. Por vezes a vida dá-nos sinais, mas estamos tão cegos que nem os vimos.
    Felizmente para ti a imaginação não acabou e continuas a brindar-nos com textos sábios.

    Beijos
    Manu

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  10. E eu estava a pensar que o poeta imaginava o pardal...

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