quinta-feira, 9 de junho de 2011

Efemerus


( imagem de minha autoria )

- Sinto-me… velho…

- Ora… tu, velho? Estás com melhor aspecto do que eu, ninguém diria que temos a mesma idade…

- … velho… velho e cansado…

- Tu és um rezingão, é o que tu és, sempre descontente com alguma coisa… sinceramente, não sei o que vi em ti, não me lembro que tu fosses assim, quando nos conhecemos…

- Filia, minha querida… tu és uma jovem, continuas bela como sempre. Agora, já olhaste bem para mim? Oh, como me sinto velho…

Ela olhou.

E um segundo depois apeteceu-lhe gritar e desaparecer.

- Efemerus, tu és um idiota. Um verdadeiro idiota. Já estamos juntos há quanto tempo? Mais de metade da nossa vida… nunca estiveste doente… viste nascer três filhos maravilhosos…

- Isso é verdade, mas…

- Nem “mas” nem meio “mas”… és um ingrato…seduziste-me ao primeiro olhar, não te larguei em momento algum, nunca nos zangámos, nunca nos faltou alimento, conforto, amigos… que mais queres tu da vida?

- Eu queria… eu queria mais… mais tempo de vida…

- Para quê, meu querido Efemerus? Para quê?

- Não sei ao certo, Filia… sinto só uma leve injustiça em viver tão pouco tempo…

Filia abanou as asas lustrosas, naquele jeito ímpar que encantara Efemerus, há muito… muito tempo atrás. Era verdade… que se aproximava a hora.

Filia e Efemerus eram dois vulgares insectos, da curiosa família dos efemerópteros, que deviam o nome precisamente ao facto de a sua esperança de vida média ser de … 24 horas, um simples dia pelo padrão humano, um piscar de olhos para uma tartaruga, um leve brisa para uma sequóia, um bocejo do universo.

- Efemerus?

- Sim, meu amor?

Ela entrelaçou as asas translúcidas nas dele, sentindo-o frio. O tempo esgotava-se.

- Efemerus… sabes uma coisa? Adorei cada um dos segundos que vivemos juntos… esvoaçando por aí, fugindo da chuva, alimentando os nossos filhotes… e descobri algo que provavelmente tu ainda não descobriste, apesar de termos a mesma idade…

Ele fitou-a longamente, os olhos já baços de um fim eminente.

- E o que foi.. que descobriste, Filia?

A voz fraquejava-lhe.

- Descobri, meu companheiro de aventuras… que valeu a pena. Que um dia, uma primavera, um ano, um milénio… não alteram rigorosamente nada do que somos, ou do que vivemos… ou do que deixámos de viver. Amanhã… e disto tenho a certeza absoluta… eu, tu, todos os nossos amigos, seremos simplesmente memórias no baú de lembranças dos que vierem depois de nós. Portanto, meu querido Efemerus… valeu a pena, não concordas?

13 comentários:

  1. Basta um momento para se viver uma eternidade.

    beijos de bom dia!

    Mariz

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  2. Como diria o outro

    Vale a pena pensar nisto!

    A vida só é efémera porque nós a colorimos com cores carregadas, se nos habituassemos a agradecer cada dia de "sol" éramos todos bem mais felizes!

    Obrigada por mais um texto lindo.

    Abraço

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  3. Mas que isto é efémero como o diabo... lá isso é!!

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  4. Efémero, é tudo... menos o passar do tempo :) Mesmo assim, vale sempre a pena! :) Beijo

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  5. Se a vida é efémera dependendo do fardo de cada um, se pensasse a árvore Sequóia acharia que viver 4000 anos tranquilos na mesma floresta ao lado das suas entes queridas, seria pouco. Se calhar o animal de carga como o Burro pode pensar que a vida é demasiado longa.

    Gostei mesmo desta história, faz reflectir na vida que levamos, muitos de nós vivem-na a correr por tanto tempo que nem se dão conta do que desperdiçam e se algum dia chegarem a se aperceber descobrem-na .... efémera ^^

    Abraço amigo ^_^

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  6. Que lindo!!! É isso mesmo, um minuto pode fazer tudo valer a pena.

    Rafaela
    Apenas um Ponto
    http://apenasumpontoesportivo.blogspot.com/

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  7. tudo sempre vale a pena..
    um simples momento bem vivido, é mais que uma eternidade de buscas, sem encontrar nada que valorize esse momento.

    bjs.Sol

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  8. Rolando, meu amigo,

    Os teus escritos são sempre tão lúcidos. Quisera possuir um pouco dessa visão realista, pois, hoje, estou convencida que "tudo vale a pena se a alma não é pequena".

    Quando nos damos conta que só temos o aqui e agora, ganhamos tanto em sabedoria e, como consequência, resignificamos o que realmente importa: as pessoas e os momentos que passamos juntos. Obrigada, por me fazer enxergar em um momento particularmente delicado. Bjs

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  9. Rolando,

    Quando li um comentário teu sobre um tema proposto na Tertúlia Virtual, lembro-me que senti um arrepio no corpo. Pensei: esse aí tem a alma e a pureza de um menino! Vai ser difícil o mundo corrompê-lo...

    Passados tantos anos, vejo que não me enganei. Continuas alimentando essa criança linda, que consegue enxergar tão bem, num mundo de tantos olhos, mas de pouca sensibilidade...

    Hoje, eu poderia te dizer tantas coisas, porém, escolho apenas uma: pra ti, jamais haverá despedidas! Valeu Reconstruir Caminhos e, nele, te encontrar. Obrigada, por tuas palavras de carinho. Elas foram fixadas, em pedra e no mais alto dos montes, para lembrar-me sempre – e olha que eu acredito em eternidade – que és um homem especial!

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  10. Rolando, meu amigo,

    Desculpe-me por abusar do teu espaço, mas não resisto... Minha filha, Juliana, leu o teu comentário e deu a definição mais simples e profunda sobre ti. Disse: mãe, esse cara é imenso!

    Achei lindo e queria compartilhar contigo, por isso voltei aqui. Bjs

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  11. VALEU POR CADA SEGUNDO....SE é que Existe Tempo....

    :-)

    BJS.
    M.M. GALVÃO

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  12. Não há efemeridade nos grandes momentos e a palavra tempo não existe quando se guarda o que de melhor fomos, temos e oferecemos.
    Vale a pena tudo o que deixa marcas, nem que seja apenas naquele segundo.

    Beijos
    Manu

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  13. Nossa... ADOREI! Adorei a foto (parabéns!) e a mensagem do seu texto! No fim das contas, a gente teima em esquecer (por medo? covardia? seja lá o que for) que o objetivo da vida é e sempre será simplesmente VALER A PENA. Só isso. A gente que insiste em querer mais...
    Beijos,
    Taís Krugmann
    amornosingular.blogspot.com

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